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  • Rayssa Carneiro

Melhores Contos – Lygia Fagundes Telles


Melhores Contos – Lygia Fagundes Telles é uma coletânea de 16 contos da autora selecionados por Eduardo Portella. Eduardo Portella foi crítico, professor, escritor e pertenceu à Academia Brasileira de Letras.


O primeiro comentário a se fazer sobre essa leitura é a escrita totalmente envolvente da escritora. Ela narra histórias felizes, tristes (por vezes amargas), reais ou imaginárias, mas não importa, cada uma delas é envolta por uma inquietação que é capaz de mostrar a verdadeira face da psique humana.


Durante as leituras e releituras desse livro, inclusive de material extra e textos de apoio pude perceber o quanto Lygia escreve sobre uma grandiosidade de coisas que se resumem, em realidade, a cada um de nós. Nessas leituras me deparei com a seguinte declaração de Hélio Pólvora (escritor e crítico literário):


“Neste belo e pungente livro, dos maiores da literatura brasileira, Lygia Fagundes Telles ensina mais uma vez que ficção se faz com gente. Gente é o material da ficção.”


Eu não pude deixar de pensar e refletir o quanto essa afirmação é verdadeira, Lygia escreve sobre gente e talvez seja esse o motivo de seus escritos serem tão fascinantes. E, pensando bem, as melhores leituras não são aquelas que tentam compreender, decifrar e dialogar sobre o ser humano? Será que é disso que se trata a literatura? Seja a fantástica ou a não ficcional, será que o seu maior objetivo não é dialogar sobre nós mesmos?


Esse foi um dos livros que me fez debruçar sobre outras leituras na tentativa de entender um pouco mais sobre o que foi lido, seja escritor ou escrito. Para mim foi impossível não morrer de vontade de ler mais coisas da querida Lygia.


Lygia Fagundes Telles, também conhecida como "a dama da literatura brasileira" e "a maior escritora brasileira viva", é uma escritora considerada por muitos críticos e leitores uma das mais importantes e notáveis escritoras brasileiras do século XX e da história da literatura brasileira.


Em 2016, Lygia foi indicada ao Prêmio Nobel de Literatura, tornando-se a primeira brasileira a ser indicada ao grande prêmio literário mundial. Apesar de já ter recebido vários prêmios, incluindo o Camões (2005) e o Jabuti (1966, 1974 e 2001), na ocasião, quem ganhou o Nobel de Literatura foi o compositor e cantor Bob Dylan.


Voltando aos contos selecionados para a coletânea um dos meus favoritos foi A confissão de Leontina. Como o próprio título diz o conto aborda a confissão de um crime, porém, tudo é descrito de uma forma tão real que chega a entristecer. É uma mistura de sensibilidade e realidade nua e crua. O conto é narrado em várias linhas temporais que aos poucos vão desenvolvendo a história da personagem principal, Leontina. A moça narra todas as dificuldades de sua vida até a “mudança para a capital” na tentativa de mudar de vida, assim como tantos brasileiros e pessoas ao redor do mundo. Devagar vamos conhecendo o passado e o presente da personagem, nenhum parece ser mais otimista que o outro, ou talvez até pareça, mas o final mostra que a trajetória de Leontina precisava ser contada de forma realista. Não é um conto feliz, é um conto real. Eu não pude deixar de pensar em quantas Leontinas existem por aí, quantas pessoas se tornam vítimas da vida, das circunstâncias.


Porém na coletânea também existem contos divertidos, mas vejam bem, é uma questão de interpretação, eu penso que são divertidos. São exemplos: As Formigas e Pomba enamorada ou uma história de amor. O primeiro é um verdadeiro conto fantástico e misterioso, narra a história de duas primas que se mudam para uma pensão, daí por diante nos deparamos com uma situação fantástica que chega a amedrontar, que envolvem formigas e um esqueleto de anão, porém, durante a narrativa também vamos conhecendo um pouco sobre essas meninas e seus relacionamentos. Já o segundo aborda um amor não concretizado, platônico e desesperado. Em minha opinião este conto mostra o apego compulsivo a um sentimento que leva a personagem principal a muitos desencontros e escolhas durante a vida.


A mão no ombro aborda a anunciação da morte através de um sonho e de forma onírica reflete sobre a vida e a iminência da morte. Em Verde lagarto amarelo vemos uma abordagem sobre a infância/família e como elas podem influenciar a vida adulta, o conto mostra dois irmãos que são ao mesmo tempo opostos e semelhantes e sua (des)amizade.


Apenas um saxofone debate sobre a prostituição feminina, o questionamento sobre a vida, o envelhecimento, relacionamentos e crise existencial. Antes do baile verde nos mostra uma jovem que se prepara para um baile, entretanto ela hesita em ir ou cuidar de seu pai que está doente, a narrativa mostra o esforço que a moça faz para encobrir seu egoísmo e acabando por enganar a si mesma.


Tanto Eu era mudo e só quanto As pérolas nos contam sobre casamentos. Enquanto a primeira história mostra Manuel aprisionado em um casamento oprimido e infeliz, mas impecável aos olhos da sociedade, o segundo nos faz conhecer Lavínia e Tomás (que se amam), entretanto, ao saber que pode morrer Tomás é envolto em diversos questionamentos sobre seu passado e futuro assim como os de sua esposa.


Herbarium narra a descoberta do primeiro amor de uma menina, refletindo também sobre a descoberta do eu interior nessa fase da vida. Seminários dos ratos é um conto inquietante que apresenta metáforas sobre situações políticas e diplomáticas em uma sociedade cheia de ratos. A missa do galo é uma releitura do conto homônimo de Machado de Assis.


A estrutura da bolha de sabão aborda a maneira como o passado pode influenciar nossos relacionamentos, com um final aberto e vago nos deixa pensando sobre a estrutura das coisas. Retrata o encontro de um ex-casal: o homem é um cientista que estuda a estrutura da bolha de sabão e a mulher passa a recordar sua infância e as bolhas de sabão no quintal. Vemos um amor adormecido, o ciúme e um passado que surge como bolhas.


Em A Caçada vemos o fascínio de um homem por uma tapeçaria que revela uma caçada a si mesmo. Em Noturno Amarelo temos outro conto fantástico que nos faz duvidar das situações descritas; a personagem principal entrega-se em memórias que nos revelam as nuances de sua personalidade e seu relacionamento com a família, isso em meio a uma viagem que duvidamos que seja real.


A presença é um outro conto interessante que mostra o choque de perspectivas quando um jovem decide se hospedar em uma casa ocupada por idosos. Sua presença naquele local pode não ser bem-vinda e talvez ele mesmo não se senta confortável em conviver com pessoas mais velhas, mesmo assim, ele escolhe viver nessa casa e aparentemente começa a envelhecer.


A leitura dessa coletânea foi marcante, cada conto aborda uma face de nós mesmos e dos fantasmas da vida humana. Penso que é bem difícil não se identificar ou se envolver com pelo menos um dos contos. Percebi que tudo o que falam de Lygia é verdade: é impossível que ela lhe passe despercebido - é para morrer de amores ou para evitar a todo custo - mas algum sentimento com certeza irá se manifestar com a leitura.


Deixo então a sugestão de leitura desses contos incríveis e também dessa escritora brasileira que merece todo nosso destaque. Se está em dúvida se lê ou não algo de Lygia imagino eu que não irá se arrepender de começar por algum desses contos. Vida longa à Lygia Fagundes Telles!

 

Muitas obras de Lygia têm adaptações cinematográficas ou em teatro. Também é possível encontrar um verdadeiro dossiê sobre a autora e seus escritos na internet. Abaixo vídeo do Jornalismo da TV Cultura sobre a nomeação de Lygia Fagundes Telles entre os indicados ao Prêmio Nobel de Literatura em 2016.


 

E você? Já leu algo de Lygia? Concorda que ela seja a dama da literatura brasileira?

Quer mandar sua reflexão pra gente? Escreva para: ler.ufc@gmail.com







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