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Clube de Leitura (vol.01, 2018)

Nesta quarta (29) tivemos o primeiro encontro de 2018 do Clube de Leitura do LER. Foi um momento bastante especial de retorno dessa que é uma das atividades promovidas pelo projeto e já tão querida pelos alunos e professores.


Marcaram presença nesse encontro o já tradicional frequentador, Yago Juan, estudante de engenharia civil, Rayssa Carneiro, ex bolsista, colaboradora do projeto e estudante de engenharia civil, Igor Rocha, estudante de biotecnologia, Anderson Sena e Dalila Almeida, ambos também estudantes de engenharia civil. Além deles, marcaram presença também o coordenador do LER e mediador do clube, professor Luis Gonzaga Rodrigues Filho, e os bolsistas do projeto Mariana Campos e José Valtemberg.




Iniciou-se o encontro com uma visão geral do LER: a necessidade de criação de algo que intervisse na realidade dos estudantes de engenharia e trouxesse mais cultura, mais arte e mais leitura para o ambiente acadêmico. Falou-se também sobre as ações do projeto, bem como o que estava sendo planejado para o futuro. Cada um dos presentes pode se apresentar e contar um pouco sobre a sua relação com a leitura. Anderson, por exemplo, sempre gostou de ler mas sentiu que após entrar para a universidade acabou diminuindo o ritmo e se distanciando do hábito de ler. Já Igor contou que ler é um hábito enraizado em sua vida e está sempre lendo artigos sobre temas variados.


O primeiro texto lido foi A beleza de uma flor, de Richard Feyman. Feyman foi um físico americano ganhador do Prêmio Nobel de Física, foi um profissional brilhante e esteve ligado ao desenvolvimento da bomba atômica, além de ter escrito diversos livros.


 

A BELEZA DE UMA FLOR


Eu tenho um amigo que é artista plástico e às vezes ele tem uma opinião com a qual eu não concordo muito. Ele segura uma flor e diz ‘veja como é bela’, e eu concordo. Então ele fala ‘como artista eu posso ver como ela é bela, mas você como cientista vai apenas analisá-la e então ela se torna uma coisa sem graça’, e eu acho que ele é um pouco maluco. Em primeiro lugar, a beleza que ele vê está à disposição dos outros e de mim também, acho, embora eu talvez não seja tão esteticamente refinado quanto ele; mas consigo apreciar a beleza de uma flor. Ao mesmo tempo, vejo na flor muito mais do que ele. Consigo imaginar as células dela, as ações complicadas lá dentro que também tem sua beleza. Quero dizer, não é só beleza nessa dimensão de um centímetro, também há beleza numa dimensão menor, a estrutura interna. Também os processos, o fato de que as cores da flor evoluíram para atrair insetos para a polinização é interessante, isto significa que os insetos podem ver a cores. E isto leva a uma pergunta, será que este senso estético também existe em outras formas inferiores? Por que é estético? Todo o tipo de pergunta interessante que somente aumenta a excitação, o mistério, e a maravilha de uma flor. Elas só aumentam. Eu não entendo como elas diminuem.

 

Daí partiram discussões sobre o fato de o texto mostrar que cientistas também são seres pensantes e tem sentimentos pelo que fazem, ou seja, veem beleza em seu trabalho. Nesse ponto surgiu a que os estudantes devem ver beleza em seus cursos. Além disso, foi discutido o conceito de beleza em sua imensidão de definições e o quanto ela está ligada com a questão cultural, sendo a cultura fator determinante para o que se considera belo em uma sociedade.

O texto gerou também um debate acerca do que seria arte e o quanto a destreza, a técnica e o academicismo são determinantes para que algo seja considerado como forma de arte. Um bom exemplo citado é a questão do grafite e da pichação, sendo o último uma forma de expressão ou apenas um vandalismo? Foram discutidas as questões históricas por trás do conceito de arte e a forma como uma obra artística incomoda o espectador e passa uma mensagem.

Outro texto lido foi o de autoria da grande escritora Marina Colassanti, No aconchego de um turbante.

 

NO ACONCHEGO DE UM TURBANTE


O único filho do velho vizir não demostrava ter herdado a sabedoria do pai. Com a morte deste, porém, herdou – lhe toda fortuna.

Logo empenhou-se em gastá-la. Novos palácios, novos elefantes, novos trajes suntuosos, novas jóias, novas babuchas bordadas. Fez-se imperioso ter um novo turbante.


Chamados, os mercadores de tecidos derramaram a seus pés damascos, veludos, brocados, cobrindo de cores e brilhos o mármore do salão, sem que nada satisfizesse o exigente jovem. Afinal, entre tantas, escolheu uma peça de delicada seda cor de palha entretecida de fios de ouro. E, para surpresa de quantos o rodeavam, exigiu que fosse toda ela utilizada na confecção do turbante. Haveria de ser o maior jamais visto por aquelas paragens.


Enrola, enrola, enrola, depois de muitas voltas o jovem viu-se coroado pelas espirais macias que, sobrepostas umas às outras, avançavam para lá da sua cabeça sombreando-lhe o rosto e os ombros. Turbante amplo como um guarda sol que foi arrematado à altura da testa com uma esmeralda do tamanho de um ovo, e um discreto penacho.


Agora o filho do vizir podia de modo condigno, pensar em outras maneiras de enfeitar sua vida e sua pessoa.


Estava justamente sentado em um banco de jardim, envolto nessas meditações, na manhã de quase verão em que uma cegonha, chegando cansada da longa migração, viu naquela estranha espécie de ninho a possibilidade de instalar-se sem delongas. Num último bater de asas, pousou bem no meio do turbante, eriçou as pernas espantando a poeira da viagem, dobrou as longas pernas, ajeitou-se, e fechando as pálpebras pálidas adormeceu.


Paralisado de surpresa, o filho do vizir perguntava-se o que fazer. Espantar animal tão benfazejo era impensável, não se enxota a boa sorte que nos escolhe. Compartilhar com ela o turbante parecia impossível. De momento, porém, não havia outra solução à vista. Não seria por muito tempo, pensou o jovem. Quando a cegonha acordasse, certamente buscaria pouso mais conveniente, uma boa chaminé, um topo de telhado, uma árvore.

Imóvel, o filho do vizir esperou.


Mas se ele havia pensado com sua cabeça, outra era a cabeça da cegonha.


Acordando muitas horas depois ela olhou em volta, e pareceu-lhe evidente que, fosse onde fosse, jamais conseguiria fazer com seu bico duro e com gravetos secos ninho acolhedor com aquele. Nunca suas penas haviam sido acariciadas por contato tão suave. E até mesmo o leve perfume que emanava do turbante a evolvia como um agrado. Encolhendo em ondas de puro prazer o longo pescoço, a cegonha refestelou-se.


A princípio no palácio e logo na cidade, comentava-se. Eleito por uma cegonha, o filho do vizir já não parecia tão leviano, dotes ocultos haviam de ter motivado aquela escolha. E de fato, o jovem, andando com passos pausados para manter o equilíbrio de tanto peso, adquiria postura mais severa, uma certa dignidade parecia transmitir-se a seus gestos. Nem mais se interessava por festas – e como poderia entregar-se a danças ou farrear com amigos, carregando aquela alada presença que mal via?


Pela primeira vez, consciente da própria cabeça, o filho do vizir descobria-lhe outros usos. Sem poder cavalgar, sem participar de torneios ou caças, deixava expandir seus pensamentos, refletia. E os serviçais surpreenderam-se vendo-o ocupado em leituras.


Depois um dia, de repente, um estremecimento no alto, um seco estalar, e eis que a cegonha havia colhido com o bico a bela esmeralda que arrematava o turbante. Em vão o filho do vizir alongou o braço apalpando. Ela havia metido debaixo de si juntamente com seus próprios ovos, e revidava a bicadas qualquer tentativa de invasão. Caído o penacho, perdida estava toda a elegância.


No palácio, porém, a ausência da esmeralda foi interpretada como um gesto de modéstia, e muito louvada.


Passou-se uma semana, outras vieram puxadas por aquela. Quanto demoram ovos de cegonha para eclodir? Indagou o filho do vizir. Agora mantinha-se quase imóvel, como no primeiro dia, não fosse um movimento em falso pôr a perder todo o esforço de vida que se desenrolava acima da sua cabeça. E parado meditava sentindo-se parte daquele milagre.


Sua expectativa teve fim no devido tempo, quando os filhotes nasceram anunciados por um pipilar estridente. E ao longo dos meses de verão ele acompanhou o alterar-se daquele pipilar, os chamados fazendo-se mais claros e fortes, enquanto minúsculas penas cinzentas caíam volteando do alto à medida que os filhotes se emplumavam.


Não durou menos do que os outros, aquele verão. Mas o filho do vizir surpreendeu-se no dia em que uma agitação maior no turbante, seguida de um grande bater de asas, denunciou a partida. A cegonha e seus filhos preparavam-se para a migração. O outono havia chegado.


De baixo, o filho do vizir viu as grandes aves brancas saindo em voo da sua cabeça com se saíssem dos seus pensamentos, indo juntar-se na distância a outras da sua espécie. Mesmo ao longe, distinguia-se entre todas uma jovem, cegonha verde.


Diz-se que, ano após ano, as cegonhas voltam ao mesmo ninho. Pensando nisso talvez, o jovem filho do vizir deteve o gesto com que se preparava a desfazer as espirais puxando a ponta da longa seda. Com extrema delicadeza tirou o turbante inteiro da cabeça, e mandou que assim como estava fosse depositado no mais alto telhado do palácio.

 

Observou-se que as ideias seriam as cegonhas que partem da cabeça de um e se espalham em outras mentes. Sendo as atitudes do jovem o reflexo de sua saída da zona de conforto e de como os atos de alguém podem influenciar na vida de outras pessoas. Concluiu-se também que o jovem acabou descobrindo o significado real do que seria riqueza.


Uma inovação dos clubes desse ano seria a apresentação de tirinhas, que são uma forma de linguagem bastante dinâmica e direta, permeadas em suma por grandes críticas sociais. No primeiro encontro foi discutida a mensagem contida em uma tirinha da personagem Mafalda.

Foi possível identificar a mensagem crítica que a tirinha quis transmitir: somos cotidianamente manipulados pelas mídias e principalmente pela indústria publicitária. Nunca o que temos é suficiente, sempre precisamos de algo mais que está faltando em nossa vida e isso é resultado em nossa falta de consciência acerca do nosso papel em sociedade e do real sentido do ato de viver.


Interligando gêneros diferentes foi apresentada a música Televisão, da Banda Titãs, que dialoga bastante com o tema da tirinha.


 

TELEVISÃO

A televisão me deixou burro, muito burro demais

Agora todas coisas que eu penso me parecem iguais

O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida

E agora toda noite quando deito é boa noite, querida

Oh Cride, fala pra mãe

Que eu nunca li num livro que o espirro fosse um vírus sem cura

Vê se me entende pelo menos uma vez criatura

Oh Cride, fala pra mãe

A mãe diz pra eu fazer alguma coisa, mas eu não faço nada

A luz do sol me incomoda, então deixa a cortina fechada

É que a televisão me deixou burro, muito burro demais

E agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais

Oh Cride, fala pra mãe

Que tudo que a antena captar meu coração captura

Vê se me entende pelo menos uma vez criatura

Oh Cride, fala pra mãe

A mãe diz pra eu fazer alguma coisa, mas eu não faço nada

A luz do sol me incomoda, então deixa a cortina fechada

É que a televisão me deixou burro, muito burro demais

E agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais

E eu digo: Oh Cride, fala pra mãe

Que tudo que a antena captar meu coração captura

Vê se me entende pelo menos uma vez criatura

Oh Cride, fala pra mãe

 

Gostaríamos de agradecer a todos que compareceram ao Encontro e dizer que foi muito gratificante ver tanta sabedoria refletida em questões relevantes que foram levantadas pelos estudantes. O próximo encontro ocorrerá no dia 12 de setembro às 12:30 na sala 22 do bloco 708. Estudantes de todos os cursos são bem vindos! Até lá!







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